Reportagens

Gestão conjunta, Propriedade privada

O projeto de Unidades de Gestão Conjunta visa promover uma gestão mais ativa, melhorar a produtividade e combater o abandono rural.

A paisagem entre as bacias do Mondego e do Vouga é marcada pelos terrenos planos, que lhe conferem um menor risco de incêndio, quando comparada com territórios com uma orografia mais acidentada. Desde sempre dedicada à produção florestal, e atualmente com predomínio do eucalipto e do pinheiro-bravo, a região não escapa, contudo, ao crescente desinteresse das gerações mais novas pela silvicultura. Ciente desta realidade, a Organização Florestal Atlantis (OFA) desenvolveu o programa Unidades de Gestão Conjunta (UGC) em parceria com a The Navigator Company.

A fase piloto abrange 1.800 hectares em três zonas do concelho de Cantanhede. “Estamos num território em que a fragmentação e dispersão da propriedade é muito grande. Os proprietários podem até ter vários hectares, mas têm duas ou três vezes mais prédios do que o número de hectares”, alerta António Cruz de Oliveira, da OFA, para quem este aspeto afeta tanto o trabalho da associação como o interesse dos proprietários pela atividade florestal. “As novas gerações não têm tempo para fazer a gestão, como os pais tinham, e vemos cada vez mais terrenos abandonados”, lamenta o responsável.

“Ao nível da produtividade, estamos relativamente bem enquadrados no que é o contexto nacional, com valores interessantes para as principais espécies florestais”, continua António Cruz de Oliveira, que destaca ainda a proximidade dos complexos industriais (tanto na fileira do pinho como do eucalipto) como outro dos atrativos da região.

Novos modelos de gestão

Com o objetivo de gerar um novo interesse e promover práticas que garantam uma maior rentabilidade às propriedades, a OFA, criada há 14 anos e que abrange os concelhos de Anadia, Cantanhede, Figueira da Foz, Mealhada, Mira, Montemor-o-Velho, Oliveira do Bairro e Vagos, decidiu testar este novo modelo de gestão.

“O que entendemos internamente é que o aumento do preço da madeira não tem significado, necessariamente, um aumento de rentabilidade para o proprietário, uma vez que muitas vezes se dilui ao longo do processo”, defende António Cruz de Oliveira. No caso das UGC, o apoio é feito sem intermediários, com a comparticipação (ou pagamento total) de algumas das operações, cabendo à Navigator o apoio financeiro em troca da entrega da madeira (de acordo com as condições normais do mercado) na altura do corte e, à OFA, o apoio técnico e o acompanhamento no terreno.

O projeto, que avança numa fase piloto de cinco anos, decorre no concelho de Cantanhede. “Decidimos dividir os 1.800 hectares de intervenção em três núcleos distintos. Com isto, reduziu-se consideravelmente o risco de um eventual acontecimento prejudicial (incêndio, praga, doença, etc.) afetar a totalidade da área. Esta divisão/ dispersão da área de intervenção permite-nos ainda avaliar a atratividade deste projeto em territórios diferentes, cada um dos quais com dinâmicas sociais próprias e com diferenças ao nível da relação dos proprietários com a terra. Pretendemos avaliar, ao longo dos próximos anos, se esta solução tem aplicabilidade nos diferentes territórios e se a generalidade dos proprietários florestais sente que este projeto constitui um importante contributo para o aumento da rentabilidade das suas propriedades”, explica o responsável da OFA, que sublinha que o objetivo é que o proprietário tenha uma gestão mais ativa e mais eficiente. “Daqui a cinco anos gostava de olhar para estes territórios e vê-los como um exemplo de gestão”, afirma António Cruz de Oliveira.


Aproximar os micro proprietários da indústria

A The Navigator Company compromete-se a financiar parte substancial das operações, a Organização Florestal Atlantis (OFA) a garantir o apoio técnico, e o proprietário a fazer uma melhor gestão dos seus povoamentos. O modelo das Unidades de Gestão Conjunta não implica agrupamento de propriedades, nem está limitado a associados da OFA. Cada produtor que se junte ao projeto não perde os limites dos seus terrenos e realiza as operações no seu tempo, com total autonomia; em troca dos apoios, empenha-se com a boa gestão florestal das suas áreas, de forma a promover o acréscimo de produtividade, e vende a madeira à Navigator.

Artigo publicado originalmente na revista n.º 12, de dezembro de 2023, que pode descarregar aqui: https://produtoresflorestais.pt/quero-receber-a-edicao-da-revista-em-papel